sábado, 9 de abril de 2011

Provocando Mino Carta


por André Pereira


Mino Carta, o jornalista genovês de 76 anos que adotou o Brasil desde os 14 anos, define Lula como “o presidente mais amado da história da Nação. É simplesmente um gênio político, dotado de uma sabedoria inata que foi sendo aperfeiçoada ao longo da sua trajetória de vida”. Mino considera que a eleição de um ex-metalúrgico, um ex-operário que se identifica com o povo, para presidente do Brasil, é um divisor de águas na história de um país como o nosso que padece,

entre outros males de origem, de uma colonização feita por predadores e de ostentar o título inglório de a última nação a declarar o fim da escravidão.

Mino acredita que o golpe de 1964 impôs danos terríveis, que o Brasil ainda não compensou. “Naqueles idos formava-se um proletário que se robustecia e poderia ter resultado em uma classe econômica e social que faria grande diferença no país”. Ele também minimiza o protagonismo militar no episódio. “Quem deu o golpe foram os donos do poder, as elites; os milicos fizeram o trabalho sujo”.

Conhecido pelos textos primorosos e pelo nível superior dos veículos impressos que criou (Veja, IstoÉ, Senhor, Quatro Rodas, Jornal da Tarde, Jornal da República, Carta Capital), Mimo fez TV, também, mas como relembrou, sofreu contrariedades. Um desses programa, da extinta TV Tupi, sequer foi ao ar, proibido no nascedouro pelo então ministro da Justiça, Armando Falcão, que considerou uma discussão sobre o machismo, atentatória à moral e aos bons costumes da ditadura brasileira. Para diversão da platéia, ele lista entre os convidados do debate o que classifica como atores garanhões do cinema pornô tupiniquim como David Cardoso e Jece Valadão.O outro programa sobreviveu por alguns meses.

E a terceira experiência televisa, “Jogo de Carta”, exibido na antiga TV Record, este, sim, vingou por três anos em sua pretensão de fazer a defesa disfarçada de Tancredo Neves contra o indigitado Paulo Maluf. Até que o governo incomodou demais os proprietários da família de Paulo Machado de Carvalho (aquele mesmo bonachão Marechal do Bicampeonato Brasileiro de Futebol) pressionando e pedindo sua cabeça.

Mino incomoda-se com a pergunta de um estudante de Jornalismo que, na platéia, menciona, de passagem, sua polêmica demissão da revista Veja. O menino quer sua apreciação sobre outro tema que se perde porque Mino fixa este episódio e ressalta definitivo: “Eu me demiti, não fui demitido”, diz para repetir, várias vezes depois, como se sua honra profissional estivesse em jogo. Narra, indignado, que contou sua saída da revista em uma entrevista de quatro horas de duração para o autor do livro “Notícias do Planalto”, Mario Sérgio Conti, que, entretanto, cunhou a versão indesejável do pé no traseiro na obra que ele trata como abominável e hediondo.

Na autoconcepção pública que ele próprio divulga, Mino é “muito chato” porque impõe um relacionamento difícil a quem está nas suas cercanias: perde o controle, costuma gritar, esbraveja e gesticula, teatraliza colérico e sanguíneo. “Mas me recomponho rapidamente. Só gostaria de ser mais sábio e sereno”, afirma, sem convencer muito quem ouve recortes de sua preciosa jornada jornalística, empreendida ainda hoje com a companhia da sua inseparável máquina de escrever Olivetti onde diz que batuca sem grande habilidade pois, às vezes,os dedos intrometem-se entre as teclas, mas segue fidelíssimo a uma imperturbável e intransferível missão de vida: “No final das contas isto é bem simples: eu só quero mesmo ser um jornalista de verdade”.

Mino Carta é diretor de redação de CartaCapital. Fundou as revistas Quatro Rodas, Veja e CartaCapital. Foi diretor de Redação das revistas Senhor e IstoÉ. Criou a Edição de Esportes do jornal O Estado de S. Paulo, criou e dirigiu o Jornal da Tarde.

André Luiz Simas Pereira ganhou o Prêmio Esso com apenas 21 anos e é jornalista no Rio Grande do Sul.

Caricatura: João de Deus NETTO
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